14.7.10

Consciência

Os raios de sol da manhã começavam já a espreitar pelos buraquinhos dos estores, eram raios brancos, notava-se que antes de atravessarem os estores passavam primeiro pela neblina matinal. Ela, estava deitada naquela cama demasiado grande e com os olhos marcados por uma noite mal dormida, olhou para a porta do quarto que, suavemente, fechava e abria sozinha chiando muito baixinho como se se queixasse fosse do que fosse. A rapariga, branca como a neve, nada parecia assustada com aquele acontecimento. Parecia estar já habituada a ver um porta com vida própria, não querendo isto dizer que estivesse muito descansada com aquilo. Com o corpo dorido de estar irrequieta naquela cama, levantou-se e dirigiu-se à casa de banho enquanto esfregava os olhos na esperança do seu desconforto passar. Passando pela porta, empurrou-a violentamente como se ordenasse silêncio. Abriu a torneira, encheu as mão em concha com água fria e levou-as à cara. Depois, como uma personagem de um filme, levanta a cabeça e fica dramaticamente a olhar-se ao espelho. E ali estava ela, à espera que aquele alguém igual a si, desse alguma resposta realmente esclarecedora. Farta, desviou o olhar para o ralo do lavatório enquanto que, por outro lado, o seu reflexo se recusava a baixar a cabeça e continuou a olhar em frente, sem medos. A branca de neve apercebera-se do sucedido, que o seu reflexo ganhara vida própria. Olhava-o pelo canto do olho, mas como acontecia com a porta, notava-se que já estava habituada a tal coisa. O reflexo era destemido, olhar forte e cabeça levantada. Ela, agarrou na saboneteira de loiça e com toda a força que a sua raiva tinha, mandou contra o espelho esquecendo os sete anos de azar. A porta do quarto abrira-se, agora violentamente, e a branca de neve correu para o quarto sabendo que algo havia lá entrado. Ficou parada à porta, agora impressionada com o que acabara de ver. Estava ali outra pessoa, pessoa essa que era igual a si, como se o reflexo tivesse saído do espelho depois de partido. Ela estava imóvel, com um ar surpreso, nunca pensara o que iria resultar daquelas assombrações que lhe cortavam o sono. O reflexo, igualmente pálido como a neve, aproximou-se com pequenos passos. "Nunca foste capaz de parar de te julgar por todo aquele mal que fizeste. Condenaste-te a ti própria e estou aqui para te fazer cumprir a sentença que tanto pensas que mereces", disse à branca que com um ar aterrorizado, ficou em silêncio. "É assim que as coisas resultam, apesar de os humanos não saberem que existimos. A partir de hoje, eu vou ser um tu melhorado" finalizou o reflexo. Puxou a branca de neve pela mão bruscamente, encostou os seus lábios aos dela, e com um simples sopro, a branca não era mais branca. Ficara com uma pele acinzentada e enrugada. O corpo ficara rijo e seco como um tronco de uma árvore. A rapariga pálida ficara sem vida. Branca de neve tinha agora uma nova alma a viver por si.

1 comentário:

João disse...

adoro os teus textos ;)